Samsara é o ciclo de renascimentos e mortes
através do qual os seres não iluminados devem passar devido ás suas ilusões
kármicas e paixões cegas. Mas antes de entrar em detalhes sobre esta tópico,
vamos entender o que é o “ser” ou uma “pessoa” de acordo com o ensinamento
budista, e também, o que é “karma” e “renascimento”.
Agora, caros amigos, imaginem que você tem
um carro na sua frente. Agora imagine que você perde uma das rodas deste carro
e a deixa de lado. O carro e a roda são idênticos? Agora pegue uma segunda roda
e proceda do mesmo modo, perguntando-se a mesma coisa. Continue a desmontar o
carro e não pare até que cada componente do automóvel seja posto de lado. Agora
pergunte-se de novo: estes componentes, separadamente, representam o automóvel?
Você irá concluir logicamente que a resposta é
“não”.
Então o que é o veículo de fato? É o nome
dado ao conjunto de elementos postos juntos e um determinado ponto. O que é uma
pessoa (um humano ou um ser não humano) do ponto de vista budista? Um conjunto
de elementos unidos em um determinado momento. Estes elementos são
representados por idéias, sensações, sentimentos, pensamentos, etc. Tudo isto
junto representa um ser humano ou não humano. Devemos ter esta explicação em
mente se quisermos entender o budismo. Esta pessoas não é uma pessoa em si mas
um conjunto de várias sensações, sentimentos, idéias, pensamentos e etc, unidos
em um dado momento.
A característica fundamental deste conjunto
é a transição e o dinamismo. Ao olhar para uma pessoa, alguém verá a imagem
deste conjunto em movimento continuo. Se alguém olhasse para esta pessoa quando
ela estivesse com três anos de idade, ela não veria a mesma coisa. Isto é
porque naquele momento, você observaria um outro aspecto do movimento. Os
componentes da personalidade teriam outro aspecto e outra forma. Após vinte
anos, você verá um outro João, Jorge ou Marcos. Ao mesmo tempo que algo é
preservado, algo também muda. Eu não sou idêntico ao meu eu de três anos e
daqui a vinte anos, eu não serei exatamente o mesmo do que sou agora. No
budismo, isto é chamado de doutrina do não-ego ou não-eu. Todas as coisas
existem através das causas e condições e portanto, não possuem uma natureza
própria ou uma identidade imutável. Por isso, estas são consideradas
vazias. Quando as causas e condições são
unidas, uma certa coisa existe, quando desaparecem, esta coisa também
desaparece.
Agora, observemos outra questão. O que faz
com que este conjunto se movimente? A resposta do Buda é: desejo e vontade.
Nossos diferentes desejos e tendências determinam uma ou outra direção;
modificam nossa história pessoa e geram karma, a ação. Karma é a lei de causa e
efeito. O termo “karma” vem da palavra em sânskrito “karman” que significa
“ação” – agir com pensamento, atos e palavras. Assim, há três tipos de karma:
karma do pensamento, da fala e do ato ou corpo. Tudo que pensamos, falamos ou
fazemos afeta nossa história pessoal. O que somos agora representa o resultado
do que falamos, pensamos ou fizemos no passado, seja nesta vida ou em vidas
passadas, e o que fazemos agora criará nosso futuro.
Então, o que normalmente chamamos de “pessoa” está em
mudança contínua e, após dez anos, por exemplo, ela não será idêntica ao que é
hoje. Embora não seja a mesma, algo permanece; bem, este algo é a continuidade
causal.
Quando um homem acende um fósforo e o fogo se
estende por toda a vila queimando a casa de outro camponês do outro lado do
vilarejo, o primeiro camponês poderia
dizer que nada tem a ver com o desastre já que o fogo que queimou a casa do outro
homem não é o mesmo fogo do seu fósforo, mas há uma continuidade causal entre
a primeira faísca e o fogo que queimou a
casa do camponês. É assim que é o karma. O conjunto está em movimento continuo,
o ser humano ou não humano é movido pelo desejo que gera o karma. Somos resultado do nosso
próprio karma.
O karma pode durar para sempre e determinar
nosso nascimento em outra vida. Então chegamos ao que chamamos de
“reencarnação”. Mas, do ponto de vista budista, uma palavra mais apropriada
seria renascimento. Quando utilizamos “reencarnação”, o que está implícito é
que haveria algo imutável e independente que passa de um corpo para outro,
porém deixei claro que aquilo que chamamos de “pessoa” está em movimento e
transformação continua e é por isso que o termo “fluxo mental” é utilizado em
textos budistas para enfatizar esta mudança constante. Assim vemos que a
palavra renascimento é mais adequada. Um homem em sua vida diária morre e
renasce permanentemente de acordo com as mudanças, as tendências e os desejos
que ocorrem no seu “fluxo mental” e no corpo físico[1].
Já demos o exemplo do homem com três e vinte anos de idade.
No momento da morte, nosso karma pessoal
determina a forma e o veículo, isto é, o corpo que o fluxo mental terá no
próximo nascimento. Nossos desejos precisam de um veículo para serem realizados
em outra vida. O ambiente em que nascemos a forma que temos dependem do karma.
Buda disse que nenhum homem sequer escapa ao seu karma:
“Nem no céu, nem no meio do oceano, nem nas
cavernas das montanhas: não há local neste mundo onde você possa se esconder
das consequências dos seus atos.”
A doutrina do karma nos ensina que somos
completamente responsáveis pelo que somos e seremos. Ninguém além de nós
mesmos, seja um deus, um humano, ou qualquer outro ser, pode ser
responsabilizado. Merecemos tudo o quanto nos acontece, ainda que seja difícil
de aceitar.
[1] Fisicamente, nossas células se modifcam a cada sete anos, então não
somos os mesmos nem sequer fisicamente.
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